Referências

As referências do menino eram as casas de madeira do Norte do Paraná. As casas perfilavam-se nas “datas” e, com o reforço dos balaústres de madeira das cercas, definiam as ruas estreitas onde brincavam de bola, de “31”, de queimada. Telhados em telha de barro, tipo francesa, tábuas unidas pelas mata-juntas, cimento queimado com vermelhão nos pisos das varandas, quando muito, ladrilhos hidráulicos ou cacos de cerâmicas formando mosaicos diversos, em sua maioria sem os labrequins de madeira nos beirais, os banheiros quase sempre fora de casa, e o sonho da casa de “material”.
Na memória, a Igreja de uma torre, linda, primeiro azul com detalhes em branco, depois amarela, com mosaicos de imagens dos santos nas paredes, o teto alto, o altar no presbitério elevado, a sacristia, e o sino batendo chamando para as “missões”. Na praça da igreja, no alto da cidade, os bancos em granitina com nome dos benfeitore e o cruzeiro em destaque ali ao lado. No salão de festas, aos fundos da matriz, aconteciam teatros, casamentos e até jogos de futebol de salão. Nas festas os espetos de bambu carregavam-se com pedaços de carne bem passada e apimentada.
A escola em alvenaria, em dois pisos, alinhava-se com os pés de café do outro lado da estrada. No pátio em cimento, na quadra de asfalto onde o piche grudava no “conga” quando o sol ardia, as crianças corriam, brincavam, divertiam-se e, sempre, no início das aulas, enfileiradas, cantavam o hino nacional. No “7 de Setembro”, após ensaios exaustivos, de cada escola, com suas fanfarras a frente, partiam os pelotões de alunos, percorrendo a cidade, até a entrada na avenida principal rumo à praça... que festa!
A praça, nova, de desenho moderno, com seu anfiteatro, sua fonte luminosa, era cenário para festas, para encontros de namorados, para passeio das famílias nos domingos, nos sábados... dias de maçã do amor, de balões de gás, do carrinho de pipoqueiro. A água da fonte, dançando, em várias cores, no ritmo das músicas, molhando o piso, numa chuva fina, como que se lavando a alma, não sai da memória! A rodoviária, também nova, moderna, linda, o embarque e desembarque em área rebaixada, com o muro de arrimo branco, ao fundo... tinha algo diferente ali. Acho que era o sabor da infância.
A estação ferroviária, a linha do trem, as escadarias para subir a barbearia com suas grandes cadeiras de ferro. A banca de revistas na calçada, a sensação especial no cinema assistindo Mazzaropi, não sei quantas vezes. Na fábrica de sorvetes, a “massa” de nata, a “vaca preta”, o sorvete de coco queimado. Foi assim, que nos meus primeiros anos, foram-se formando minhas referências na arquitetura e também nos valores e princípios que me levaram vida afora. Assim começou a construção do meu repertório cultural, simples assim. São caminhos que me levaram a arquitetura e, sem saber, já despertavam minha atenção, provocavam sensações, temperavam minha vida.
E você, quais foram suas primeiras referências?